quarta-feira, 29 de outubro de 2008

Livros Olímpicos- Heróis da América

O livro que abre a série dos Livros Olímpicos no blog é "Heróis da América", de Odir Cunha, que conta passo a passo toda a história dos Jogos Pan-americanos até o ano de 2007. São todas as curiosidades de 14 edições do evento e mais uma prévia, que se aproximou bastante do que aconteceu, para os Jogos do Rio.

Na minha opinião, um livro digno do evento, que é visto com maus olhos por boa parte da imprensa e do público, que acha que não atrai bons atletas. Uma informação importante do livro é que todos os medalhistas olímpicos de Cuba em 2004 estavam no Pan de 2003. Apenas um dos milhares exemplos que comprovam a importância dos Jogos Pan-americanos.

Odir Cunha gentilmente contou ao blog como se apaixonou pelo Pan, como escreveu o livro e como é sua obra.

Bem, eu gosto de Jogos Pan-americanos. Gostei da primeira vez que li uma matéria em uma Fatos & Fotos sobre os Jogos de Winnipeg, em 1967. Lá estavam as fotos dos que ganharam as 11 medalhas de ouro para o Brasil, do tenista Thomaz Koch ao iatista Joerg Bruder. Guardei aquela reportagem por muito tempo.

Na verdade, eu me lembrava de alguma coisa do Pan de São Paulo, em 1963. Tinha 11 anos e me recordo da final do futebol, jogo em que o Brasil ganhou da Argentina e saiu um quebra-pau no fim. Mas a paixão pelo Pan, mesmo, começou com essa matéria em 1967.

Acompanhei, como torcedor, as edições de 1971, em Cali, e 1975, no México. De Cali lembro-me das ruas lotadas para acompanhar as provas de ciclismo, já que os colombianos eram favoritos neste esporte. Do México ficou a decepção de ver os anfitriões apagando a luz para impedir que o Brasil fosse campeão na final do futebol, com a Seleção Mexicana. Como o jogo estava 1 a 1, dividiram o título – uma vergonha, para um país que cinco anos antes tinha torcido pelo Brasil na Copa do Mundo.

Bem, quando chegou 1979 eu já era repórter do Jornal da Tarde e mesmo sendo um foca fui escolhido pelo Vital Bataglia, editor de esportes, para cobrir o evento ao lado do eclético Castilho de Andrade. Era um foca, mas já tinha feito umas belas reportagens e o Bataglia resolveu bancar minha ida a Porto Rico. Eu e o Casta passamos umas das semanas nos preparando para o evento, visitando federações e confederações, fazendo listas de recordes brasileiros e sul-americanos de natação, atletismo, levantamento de peso... Não havia Internet, claro. E nem tabelas de recordes ou bibliografia sobre o Pan. Era preciso um trabalho braçal considerável.

Confesso que eu já viajei com a intenção de ganhar o Prêmio Esso. Seria pretensão falar sobre isso àquela altura, querer o maior prêmio do jornalismo brasileiro logo na primeira viagem internacional, mas a verdade é que fui com esse pensamento para Porto Rico.

No ano anterior a equipe de esportes do Jornal da Tarde havia ganhado o Esso pela cobertura da Copa do Mundo da Argentina. O jornal editava um caderno por dia sobre a Copa. Fiquei na retaguarda, mas fiz várias matérias de página inteira, algumas de boa repercussão.

Imaginei que como o Pan seria o evento principal de 1979, o jornal ou revista que o cobrisse melhor ganharia o Esso de Informação Esportiva. Em San Juan tive a sorte de dividir apartamento com Fernando Sandoval, jornalista da Isto É que me deu boas dicas para uma cobertura diferenciada, fugindo do factual.

Lembro-me que cheguei a fazer comentários políticos sobre a situação de Porto Rico e sua dependência dos Estados Unidos – o que provocou críticas do subeditor Belmiro Sauthier –, mas o bom quando se está longe é que você trabalha mais solto, vai pela sua cabeça, não tem um pauteiro restringindo seus passos e espaços.

Quando voltamos, vi o que tinha saído no Jornal da Tarde e, mesmo um pouco decepcionado com a edição, percebi que o material era bom e poderia ser inscrito no Prêmio Esso. Falei com o Castilhinho e ele foi contra. Quase desdenhou. Achou que era difícil, não tínhamos chance...

Pois eu insisti. Deu uma caixinha para os contínuos providenciarem as 20 cópias de cada página da cobertura, levei a ficha de inscrição para o editor Laerte Fernandes assinar e mandei para a Esso. Acho que um mês depois, quando cobria um Comercial e Flamengo em Ribeirão Preto (naqueles Brasileiros com quase 100 times), fui avisado que havia ganhado o Prêmio Esso, o único do JT naquele ano e por muitos anos mais.

Se já tinha motivos para gostar dos Jogos Pan-americanos, o Esso fez crescer ainda mais meu carinho pela competição.

Porém, por ironia de nossa profissão, quando você se destaca já recebe convite para exercer cargo de chefia e se afasta da reportagem. Obviamente se tivesse continuado no Jornal da Tarde teria coberto muitas outras competições internacionais e provavelmente ganhado outros prêmios, mas fui editar revistas, produzir rádio e nunca mais pisei em um Pan.


Oscar e os Heróis da América
Porém, a oportunidade de ser o biógrafo e escrever o livro de Oscar Schmidt, em 1996, me aproximou novamente dos Jogos Pan-americanos, pois tivemos de contar a vitória heróica sobre os norte-americanos em Indianápolis. Esse trabalho também foi relevante, pois da nossa pesquisa surgiu o recorde extra-oficial de pontos que o Oscar detém hoje.

A idéia de um livro completo sobre o Pan sempre me acompanhou e percebi que seria possível depois de escrever Time dos Sonhos, contando a rica história do Santos Futebol Clube. Após os dez anos de pesquisa e texto para fazer “a bíblia do santista”, qualquer outro livro pareceria fichinha.

Somando todo o tempo, creio que levei cinco anos para terminar Heróis da América. Tive de conciliar outros trabalhos com a pesquisa para o livro, mas, coincidentemente, ele acabou pronto poucos meses antes do Pan do Rio de Janeiro (desde o Pan de Porto Rico eu já guardava impressos sobre os Jogos, entre eles um livro publicado pelo comitê olímpico de Cuba com resultados até 1975).

O Heróis da América deveria ter ficado pronto para o Pan de 2003, em Santo Domingo, e seria publicado pela Editora Elevação, mas não consegui terminar a tempo. Em dezembro de 2006 levei o projeto para o conhecido editor José Henrique Grossi, o mesmo que havia lançado a biografia de Oscar Schmidt. O José Henrique estava na Editora Planeta e gostou do projeto.

A Planeta escalou profissionais destacados para tocar o livro, entre eles o artista plástico Vanderlei Lopes, que deu ao livro ares de uma obra de arte. Não se economizou na edição e o resultado foi um dos livros ao mesmo tempo mais completos e mais bonitos já editados sobre esporte no Brasil.
Tenho ou conheço quase tudo que já se publicou sobre esportes no País, e posso dizer que, raríssimas exceções, ou o livro tem muitas informações, mas é pobre e feio graficamente, ou tem visual deslumbrante, mas é superficial e vazio de informações. O Heróis da América tem as duas qualidades.

Como o tempo era curto, eu mesmo fiz a pesquisa iconográfica e negociei a compra das fotos com a Agência Estado e com a Sporting Heroes, dos Estados Unidos. O resultado é um material fotográfico riquíssimo. Descobri até uma pequena foto do Pan de 1955 feita por ninguém menos do que Che Guevara, à época um fotógrafo free lancer de uma agência de Buenos Aires.
A Editora Planeta imprimiu dez mil exemplares e imaginei que seriam vendidos até com alguma facilidade, mas descobri que não há tanta gente que ama os Pan-americanos como eu (risos). Na verdade, parece que até alguns jornalistas que se dizem “esportivos” odeiam os Jogos.

O que é de uma ignorância atroz, pois assim como um fruto só nasce depois da flor, não dá para se tornar uma potência olímpica sem antes atingir um alto nível entre os pan-americanos. E o Pan é, sim, essencial para o desenvolvimento esportivo dos países do continente.
Sempre foi importante para o Brasil, que já penou muito para se tornar um dos mais bem classificados. Basta lembrar que em Chicago, em 1959, só Luizão e Adhemar Ferreira da Silva conquistaram medalhas de ouro. O Pan serviu de parâmetro e motivou os atletas brasileiros a darem saltos mais altos.

O comitê olímpico do Chile elaborou um dossiê no qual chegou à conclusão que um dos maiores obstáculos ao desenvolvimento do esporte chileno foi nunca ter sediado uma edição do Pan. E o Brasil teve o Pan em 2007 e parte da mídia o tratou com desdém... Vai entender...
Hoje entendo melhor porque falta uma melhor cultura esportiva ao povo brasileiro. Um dos motivos é que falta uma melhor cultura esportiva aos jornalistas “esportivos” brasileiros. Espero que vocês, da nova geração, amem mais o esporte do que os que hoje monopolizam os microfones, canais esportivos, portais, e usam esse espaço em benefício próprio.

Amigos já me disseram que fazer um livro como “Heróis da América” em um país como o Brasil é o mesmo que jogar pérolas aos porcos. Eu discordo. Sempre há os poucos e bons que bebem até a última gota do conhecimento acessível. Eu compraria e leria Heróis da América de cabo a rabo, se ele existisse em 1979. Os melhores jornalistas esportivos do futuro devem ter feito o mesmo. Ao menos é a minha esperança (risos).
O livro ainda me deu a oportunidade de ser o curador de uma belíssima exposição no Sesc Vila Mariana. Exposição que depois migrou para outras unidades do Sesc e foi vista por milhares de pessoas. Também dei várias palestras sobre a história do Pan – em unidades do Sesc de São Paulo, Santos, Taubaté, e na Faculdade de Educação Física da Uniban, na qual tive a honra de ser convidado pelo medalhista olímpico Douglas Vieira, alguém que, como poucos, sabe a importância da cultura esportiva.

Então, a semente foi plantada e isso é o que importa. E ela germinou em corações férteis, como o seu, Guilherme. O respeito ao Pan passa pelo respeito aos atletas, aos seus técnicos, às pessoas que verdadeiramente fazem o esporte. É preciso ter sensibilidade e humildade para entender isso.
E se para muitos o Pan é uma competição menor porque não tem os melhores atletas do mundo, eu já acho que parte de sua grandeza está justamente nessa capacidade de unir atletas de vários níveis – alguns quase amadores, de pequenas nações que dariam tudo por uma medalha de ouro no Pan (como Bolívia e Paraguai, que jamais sentiram essa felicidade), e outros que estão entre os melhores do planeta.

Quem viu a Olimpíada de Pequim deve se lembrar de uma cena em que Michael Phelps sai da piscina mal-humorado depois de ganhar mais uma medalha de ouro e bater mais um recorde mundial. É que ele não tinha feito o tempo desejado e por isso não gostou. Ora, eu quero que o Phelps vá plantar batatas!
Esse esporte de tecnocratas, de máquinas ganhadoras, não é o meu esporte. Eu vibrarei muito mais quando um boliviano ganhar uma medalha de ouro no Pan do que com um sujeito que vence provas às dúzias em uma Olimpíada e ainda sai de cara fechada.
Os Heróis da América são seres humanos. Por isso é que são heróis.
Odir Cunha Odir Cunha foi jornalista, ganhou duas vezes o prêmio Esso, por suas coberturas feitas pelo Jornal da Tarde na Copa do Mundo de 1978 e nos Jogos Pan-americanos de 1979.
Atualmente, ""apenas"" escreve livros, e recentemente publicou "Sonhos mais que possíveis", com breves histórias olímpicas muitas vezes não muito circuladas nos livros sobre o assunto.
Foi editor de cinco revistas especializadas em tênis além de escrever o livro "A História do Tênis feminino brasileiro", em 1989. Ainda foi o escritor da biografia de Oscar e do livro Time dos Sonhos, a história completa do Santos Futebol Clube.

Um comentário:

  1. acho que esta entrevista esta boa
    tambem gosto muito dos jogos panamericanos e acho que muitos atletas campeõs vieram ao Rio sim.
    Felipe Santini -- Rio de janeiro

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