quarta-feira, 16 de setembro de 2009

Soraia André- Uma vitoriosa

O judô feminino vive uma fase nunca vista antes. Não dependemos mais de uma atleta como era com Edinanci Silva até o começo da década de 2000. Não vamos mais para uma Olimpíada sem chances de medalhas, agora vamos com atletas preparadas e que se não são favoritas ao pódio, tem chances reais de conquistá-lo. Nos mundiais, antes íamos com atletas para ganhar uma luta e sair no lucro, hoje em dia temos vitórias nas mais diversas categorias. E tudo isso começou com um nome pouco conhecido mesmo dos amantes do esporte, Soraia André.

Ela começou no início da década de 1970 a praticar o judô e em 1977 já era o principal nome da modalidade entre as mulheres. Porém, não podia competir internacionalmente. Em 1965, um decreto de lei do Governo Militar proibia as mulheres de disputar competições consideradas incompátiveis com as condições femininas como "Luta de qualquer natureza, futebol de salão, futebol de praia, pólo aquático, halterofilismo e beisibol".

Essa imposição fazia com que todas as lutadoras abandonassem o esporte na adolecência. Não foi o que aconteceu com Soraia. Passou a treinar só com meninos e, com 1m70 e muito forte não fazia feio com os machões. No fim de 1979, a lei que a impedia de competir foi revogada e as competições começaram a pipocar pelo Brasil.

Em 1980, disputou o primeiro mundial e caiu na primeira rodada, assim como todas as outras mulheres. A diferença com relação as atletas do leste europeu e asiáticas eram muito grandes. Apesar do fim da leu que a impedia de competir, as mulheres seguiam em total segundo plano na Confederação de Judô. No Pan de 1983, o primeiro com disputas femininas, Soraia foi bronze e foi uma das quatro medalhistas do Brasil. O treinamento das mulheres só acontecia depois de todo o treino dos homens.

Para o campeonato Pan-americano de 1985, Soraia recebeu uma notícia no mínimo inusitada. Teria de emagrecer 13kg para se encaixar na categoria até 78kg. Como discussões não eram permitidas, ela optou por seguir as ordens e passar um natal praticamente sem comer. A fome não tirou sua força e ela ficou com a prata no torneio da competição.

Nos Jogos Pan-americanos de 1987, o Brasil fez sua melhor campanha do judô feminino, com duas campeãs, uma delas Soraia André. Em 1988, o judô feminino foi esporte de exibição da Olimpíada, não valeu medalha, e ela perdeu na primeira luta. Interessante falar que a técnica era uma filha do então presidente da entidade e não aparecia nunca para ajudar as brasileiras.

Mais um ciclo olímpico passou, Soraia foi ao mundial de 1990 e foi medalha de bronze no Pan de 91 e conseguiu classificação para Olimpíada de 1992. Agora, a modalidade já era oficial, valia medalhas. Perdeu na primeira luta. Ainda em 1992 e já amiga das atletas estrangeiras, descobriu que cada atleta que disputava os torneios e campeonatos internacionais ganhava um prêmio. Não era muito, era simbólico, mas era um prêmio. E a Confederação nunca havia dado nada a ela, que participara de competições internacionais há 10 anos.

Colocou a boca no trombone e foi reclamar com a Confederação. Disse que se não ganhasse o dinheiro, iria reclamar com o ComitÊ Olímpico e com o ComitÊ organizador do mundial. Recebeu o dinheiro. E recebeu também um basta. Ela tinha 28 anos e meses depois de sua reclamação, a Confederação baixou uma resolução dizendo que apenas atletas com menos de 28 anos poderiam ir para a seleção. Ela sabia que a reclamação no Japão era uma certeza da expulsão da equipe. O ato que a CBJ instituiu foi a meneira mais discreta de se fazer isso.
Em 1993 aconteceria a seletiva para a equipe brasileira e Soraia foi impedida de competir. E deu um golpe de misericórdia, terminando com um ippon sua belíssima carreira. O evento tinha cobertura de toda imprensa, que estava empolgada com o crescimento do judô no país, já que nas Olimpíadas de 88 e 92 o Brasil havia feito um campeão olímpico. Sem poder competir, ela apareceu no Ginásio de competição com um quimono preto escrito a palavra luto e com no pescoço suas medalhas pan-americanas e sul-americanas.

O protesto foi o assunto da imprensa que foi cobrir a seletiva. Como fez tantas vezes no judô, ela usou a força do adversário para derrubá-lo.

NA ESTANTE
Atleta, substantivo feminino- Vinte mulheres brasileiras nos Jogos Olímpicos- Oscar Valporto- Casa da Palavra

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2 comentários:

  1. Já conhecia muito da história de Soraia André, infelizmente tivemos esse período trágico na Confederação Brasileira de Judô.
    Parabéns Soraia, pelo sua garra e determinação.

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